terça-feira, 15 de janeiro de 2013

O GRANDE IRMÃO MAIS PRESENTE DO QUE NUNCA


Resolvi publicar o texto "OS GRANDES IRMÃOS" no meu blog depois que vi duas reportagens na TV.

A primeira, na TV Brasil, um jornalista falava sobre o aparato tecnológico de comunicação dos EUA que pode gravar qualquer conversa feita por meio eletrônico no mundo. Além de comentar que é um caminho sem volta, o jornalista disse que este mesmo aparato está sendo usado para espionar empresas que concorrem com empresas americanas na competição por mercado.

A outra reportagem é do jornal HOJE, da Rede Globo,  onde a jornalista mostra câmeras vigiando os trabalhadores nas empresas, os funcionários vigiados são entrevistados e dão depoimentos conformistas e no fim, a matéria sugere que é uma “tendência” que veio para ficar.

O texto abaixo comenta o livro 1984, foi escrito em 2002. Uma década depois, a realidade que o autor do texto fala e imagina, já é uma realidade absoluta.

OS GRANDES IRMÃOS*

George Orwell, em 1984, atirou no que viu e acertou no que não viu. Muitas de suas previsões não se concretizaram exatamente até o ano de 1984 mas aos poucos os limites da vida privada se reduziram de uma forma que ele, logo após a Segunda Guerra Mundial, não podia prever: videovigilância na rua ou por satélite, internet, telefone celular, decifração do código genético e tantas outras novidades que irrompem a todo momento.

Aquilo que se passava, no romance de Orwell, numa Londres atravancada por ruínas de guerras passadas, sob vigilância do chefão do partido único, o Big Brother, insinuou-se agora na vida ordinária das pessoas, e atende pelo nome de progresso tecnológico. Toda tecnologia nova tem dois gumes. Pode ser usada para o bem ou para o mal. Incidentalmente as grandes invenções sempre se apresentam como ferramentas para facilitar a vida. O outro lado da moeda mostra que no trabalho, na rua, nas grandes superfícies, todo mundo vigia todo mundo.

Dois terços das grandes empresas americanas efetuam uma forma ou outra de vigilância eletrônica sobre seu pessoal. EUA, Inglaterra, Canadá e Austrália estão estabelecendo as bases de dados nacionais sobre o DNA dos criminosos.

Legais ou não, os meios de espionagem se tornam diabolicamente sofisticados e muito facilitados. Dia virá em que câmeras de vídeo do tamanho de uma abelha voarão numa peça para se fixar na parede ou no teto a fim registrar o que se passa ao redor. A baixa do preço e a miniaturização das câmeras (semelhantes à que o repórter Tim Lopes usava quando foi surpreendido tentando documentar o comércio de drogas nos bailes funk) permitirão em breve recorrer à videovigilância quase por toda parte e todo tempo. Do local de trabalho as pessoas poderão vigiar, na tela de seu computador, como se comportam os filhos em casa.

Cada vantagem induzida pela tecnologia - ruas seguras, comunicações baratas, lazer diversificado, serviços públicos eficazes, compras facilitadas - justifica a entrega de uma parcela de informação individual suplementar.

O físico inglês Duncan Campbell e grupos defensores das liberdades civis denunciam a interceptação, por parte da Agência Nacional de Segurança americana, de telefonemas, faxes e correios eletrônicos no exterior. Não apenas os EUA, mas dezenas de outros países possuem capacidade de interceptar ''qualquer tipo moderno de comunicação de alto consumo''. Até mesmo eleição eletrônica, com a qual os cidadãos votam por um sistema protegido por código, é sujeita a fraude.

O local de trabalho é o mais suscetível de ser espionado. A tentação da espionagem é grande entre empresas (prejuízo médio de 6% por causa de fraudes internas) que utilizam cada vez mais câmeras de vigilância, exames do conteúdo dos computadores, registros das chamadas telefônicas e, em alguns casos, detetives particulares. No Japão algumas empresas dispõem de banheiros que realizam automaticamente testes de detecção de entorpecente e filmam pessoas suspeitas de se drogar. O anti-herói de 1984 trabalhava no Ministério da Verdade num mundo regido contraditoriamente por três slogans: a guerra é a paz, a liberdade é a escravidão, a ignorância é a força. O problema já era de linguagem e História, o que a rigor ainda constitui a base da sociedade moderna. O requisitório de Orwell dizia respeito a uma ditadura absoluta. Já o progresso tecnológico desabrido da atualidade se realiza em países que se orgulham de suas democracias...

*Léo Schlafman, Jornalista. Jornal Brasil - 04 de julho de 2002.

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